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31 de maio de 2010

VIVER COM APENAS 100 COISAS


SIMPLES - Da simplicidade simples surgem as ideias mais sustentáveis. | imagem: Planeta Sustentável

VALDÍVIA COSTA

Numa busca por algo leve, sustentável, pra começar a semana com o velho bom humor reinando absoluto, achei essa matéria sobre um homem que é diferente de todos os habitantes terrestres. Ele não é consumista. Não entope o mundo com sacolas plásticas achando que está se tornando grande e bem posicionado. Mas vamos deixar pra o blog colega verde Iniciativa Sustentável contar essa história. Foi lá onde li sobre este super homem nietzscheniano, que se diferencia "através da transvaloração de todos os valores do indivíduo".

Lógico que, qualquer um de nós habituados com todo o conforto que a civilização moderna nos deu, vai achar no mínimo estranho. Ter que viver com apenas 100 coisas. Será que as peruas que eu conheço conseguiriam? Será que os ricos mais ricos do mundo fariam algo parecido, talvez em menor proporção? Talvez eu conseguisse, se não fosse a vida gritando pra eu correr o tempo inteiro. Mas, isso não vai ser mais tão esquisito, caso queiram eliminar mais coisas desnecessárias. Incluindo algumas pessoas, porque não?

(...) Quero mostrar aqui uma nova visão do modo de se lidar com as coisas, que descobri, como não poderia deixar de ser, navegando por essa vasta rede mundial (www: World Wide Web). Foi quando me daparei na revista Vida Simples com a história de um cara que decidiu viver com apenas 100 coisas. Ele se lançou a esse desafio depois de parar para olhar à sua volta e descobrir que não estava cercado de pessoas, de laços, de sentimentos, mas de coisas.

Conte comigo, quantas coisas você deve ter? A começar pelo computador ou notebook, no qual você está lendo esse texto. Imagino também que esteja usando uma vestimenta, composta de roupas íntimas e roupas de cima, e que no seu armário há várias combinações desses modelos. Você deve ter um celular, escova de dentes, mouse, diversas canetas que sempre se perdem, agenda, livros, revistas que nunca terminou de ler, relógio, cama, colchão, cds, dvds, sua garrafa d’água pessoal, porta-retratos com os entes queridos, barbeador/depilador, um ou dois carros. Isso se falando coisas relativamente básicas para a vida moderna e que não têm que ser repostas periodicamente, como sabonetes, pasta de dentes, papel higiênico e por aí vai.

Pois Dave Bruno se saturou de todas essas coisas e começou a pensar: preciso mesmo de tudo isso? Quantas coisas, objetos, um ser humano precisa para viver? E então lançou o desafio das 100 coisas: viver um ano com apenas 100 itens. Ele passou o ano de 2009 assim e já lançou o desafio para 2010.

Aí você me diz: “que espécie de escritora maluca é essa que imagina conversar com o leitor?” Não, quero dizer, você provavelmente deve estar se perguntando onde entra o materialismo aqui, já que a ideia é se livrar das coisas. Pois aí é que está o verdadeiro x da questão. Imagine que, durante um ano, você pudesse usar apenas uma caneta Bic. Nenhuma outra. Você cuidaria ao máximo para não perder ou estragar o objeto, afinal, ficar sem caneta quando se precisa é um suplício (pelo menos para uma jornalista). Como adquirir uma caneta é coisa mais fácil e banal do mundo, a gente não costuma se precupar muito com esse objeto. E essa atitude se estende ao muito que temos.

Não só temos um excesso de coisas como cuidamos mal dessa infinidade de itens e temos que adquirir novos objetos para substituir o que foi quebrado ou perdido. Daí a ideia de ser materialista, no sentido de preservar seus bens. Pensar em cada nova aquisição como se fosse algo único, não automático.

Além disso, cada bem que você tem é realmente especial, mesmo que seja uma caneta Bic, porque os materiais usados na fabricação foram retirados de algum lugar ao qual provavelmente não retornarão. Mesmo uma simples caneta foi feita, pensada, embalada e transportada por pessoas que fazem disso a sua vida.

28 de maio de 2010

A FOTOGRAFIA TRANSFORMA


FLAGRA: Imagens do antigo Hospital João Ribeiro, em Campina Grande-PB, desativado depois de publicação das fotos no jornal Correio da Paraíba e matéria sobre negligência médica aos doentes mentais. Reativação do tema 'artigo' com nova roupagem. | imagens*: Antônio Ronaldo

A FOTOGRAFIA COMO INSTRUMENTO
DE CRÍTICA SOCIAL TRANSFORMADORA DA REALIDADE (2009)

Universidade Federal de Campina Grande (UFCG)
Disciplina Cidade e Cultura Visual, do Mestrado em História


**VALDÍVIA COSTA(1)

Poucos são os trabalhos jornalísticos atualmente que têm cumprido seu papel cidadão de ajudar a população a encaminhar ou resolver problemas sociais. Dada a importância de se documentar historicamente os casos em que essa atividade tem cumprido o seu papel ético, o presente artigo refere-se ao tipo de jornalismo que se envolve com uma temática a ponto de solucionar um possível embate surgido a partir do fotojornalismo, que será analisado aqui como instrumento de crítica social transformadora da realidade.

O primeiro registro de que se tem notícia sobre uma prática desse tipo no fotojornalismo foi em seus primórdios no início do século XX. Os repórteres fotográficos começaram a trabalhar a fotografia como referência imagética para uma transformação social logo na primeira década desse século. Foi notado por Gisele Freund (1995), que os primeiros fotojornalistas surgiram entre 1908 e 1914. Alguns começavam a entender a realidade a sua volta como fonte de inspiração para conscientizar a população acerca de um problema social.

A autora alemã, que atuou como uma das primeiras mulheres fotojornalistas a surgir na França na década de 1930, apresenta Lewis W. Hine, um sociólogo que flagrou com sua lente o trabalho infantil nos Estados Unidos antes dele ser combatido pelas leis. Nas imagens do fotógrafo, em 12 horas diárias, os pequenos realizam trabalhos de adultos nas fábricas ou nos campos. A temática não era recorrente e os estudos de Gisele não indicam se havia uma intenção desses fotógrafos em conseguir transformar uma determinada situação desigual ou injusta para uma parte da população.

Se o alvo desse fotojornalismo, nesse período, era acabar com esse tipo de trabalho explorador e desumano ou não, a autora não comenta. Mas Gisele diz que as fotografias das crianças trabalhando despertaram a consciência dos americanos e suscitaram uma mudança na legislação sobre o trabalho infantil.

Gisele ainda relata que esse trabalho de Lewis foi o primeiro que deu à fotografia uma característica de arma na luta em melhorar as condições de vida de pessoas pobres(2). A partir desse recorte de tempo podemos perceber que a fotografia passa a ser lida também, visto que sua linguagem visual passa do estado conotativo para o denotativo ao agregar texto à imagem no fotojornalismo. Vamos dialogar um pouco com Roland Barthes (1978) e descobrir qual a diferença entre esses dois códigos que fazem da fotografia uma retratação da realidade, mas também um símbolo metafórico, dependendo do olhar empregado no objeto fotografado.

Depois desse episódio com as crianças de Lewis notamos que esse tipo de fotografia começa a recorrer mais nos periódicos, já consolidados e com públicos definidos. Diante da realidade econômica, política e social nos períodos que se seguem entre as duas guerras mundiais, os fotógrafos tiveram vasto material humano de muita pobreza, exclusão e injustiças.

Intencionados ou não para fazer crer que esse tipo de imagem causava realmente uma mudança ao ser publicada e comentada entre as pessoas, os repórteres fotográficos usaram e abusaram dessa temática ao longo desses últimos 70 anos. Era o que Gisele definiu como o fotojornalismo moderno, atividade tão atual e objetiva que até a nitidez da imagem ficou em segundo plano, em detrimento do assunto e da emoção que a foto foi capaz de suscitar explorando temáticas humanas(3).

A mesma emoção e comoção que abateram também os EUA ao ver a fotografia de uma criança nua, correndo queimada, gritando por socorro entre os fugitivos de uma invasão bombardeada americana no Vietnã (1939). Essa foto em particular mobilizou organizações mundiais de combate às guerras e de direitos humanos, que se uniram em defesa do fim da guerra do Vietnã.


No Brasil, a imprensa já trabalha com esse tipo de imagem no sentido de provocar ações e soluções para os problemas sociais. Embora muitos meios explorem o fotojornalismo denúncia apenas pelo sensacionalismo comercial que o mesmo causa, muitos profissionais conseguem resultados profissionais através de imagens de um cotidiano moldado pela lógica capitalista, excludente e marginal, que deixa parte da população carente de muitas necessidades.

Um desses problemas foi retratado em Caxias do Sul (RS), ao flagrar a mãe sentada numa calçada, próxima a restos de lanches, enquanto a filha pede dinheiro num carro. O motorista pára ao notar o tamanho da criança. Em qualquer cidade que tenha um tráfego intenso de carros é comum vermos as mães usarem os filhos para pedirem nos sinais de trânsito e nas ruas.

Talvez a imagem não tenha circulado muito porque encontrei-a no blog Brasil contra a pedofilia(4). Os Ministérios Públicos de alguns Estados brasileiros já estão linkados no blog e em contato com essa realidade. Supomos que esse contato virtual é válido porque, daí para aplicar um método de trabalho que controle ou elimine o problema social, é mais viável. O contato desses órgãos públicos com o fotojornalismo, que retrata a realidade vista no cotidiano de todos, menos no das autoridades, poderá ocasionar mais um desfecho que essa atividade profissional provocou.

Ao adotarmos a ideia de fotojornalismo empregada por Barthes, a fotografia de imprensa é uma mensagem porque, para a foto ser feita, ela passou por uma fonte emissora (jornal), um canal de transmissão (jornal ou revista) e um receptor (leitor). Além disso, a foto ainda recebe sua característica primordial para identificá-la como jornalística, uma legenda, um texto pequeno que “informa” o que tem na foto(5).

Para o autor, a imagem fotográfica é uma mensagem sem código. Como os desenhos, quadros, cinema e até o teatro, Barthes definia-as, assim como a fotografia, de mensagens sem códigos devido as suas reproduções analógicas da realidade. E todas, para ele, comportam dois sentidos apenas, um denotativo e outro conotativo, definido pelo autor como “a maneira de leitura e o que a sociedade pensa sobre o que foi fotografado”(6).

Por pensar justamente na imagem que proporciona um desfecho social e a conotação, definida por Barthes como a imposição de um sentido segundo a mensagem fotográfica propriamente dita, elaborada desde a escolha do tema a ser fotografado até o lugar que a imagem terá na página de um jornal, é que escolhemos a série fotográfica realizada no hospital João Ribeiro, localizado no bairro da Liberdade, em Campina Grande (PB), no ano de 2005.

O tema fotografado teve a sua importância como produto fotojornalístico. Enquanto imagens denunciativas, o ensaio serviu como motivador para a transformação da realidade. Além desse fator primeiro que norteia este artigo, também nos detemos na conotação feita pelo autor do ensaio, o fotojornalista Antônio Ronaldo, 45, que usou enquadramentos e perspectivas fotográficas que dessem a entender à população o nível de crueldade no tratamento desumano que os pacientes desse hospital estavam sofrendo.

Antônio Ronaldo foi o autor desse furo de reportagem fotográfica na Paraíba, que acarretou em duas implementações importantes para os doentes mentais de Campina Grande, o descredenciamento do hospital João Ribeiro e a instalação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) na cidade.

O tipo de sentido provocado nas pessoas que viram as fotografias dos pacientes do hospital João Ribeiro foi o de revolta, visto as continuidades de materiais jornalísticos que foram produzidos a partir da matéria veiculada no jornal Correio da Paraíba. Aliada às imagens reais, de pessoas sofrendo, sendo tratadas sem o mínimo de critério profissional, está a sensibilidade do fotógrafo, que conseguiu captar outras mensagens subjetivas do ambiente.

A série fotográfica utilizada neste estudo é formada por cópias digitalizadas das fotos originais que têm cerca de oito megapixels cada uma. As imagens foram feitas com uma Nikon D100, lente 17-35mm, sem flash, num período de oito minutos, segundo explicou o fotógrafo Antônio Ronaldo.

O trabalho fotojornalístico surgiu de um trabalho freelance que o fotógrafo realizou para a Secretaria de Saúde municipal, a pedido de uma representação do Ministério da Saúde que fiscalizava os hospitais psiquiátricos do Brasil. Disfarçado de membro da equipe da secretaria municipal, o fotógrafo mal entrou no hospital e já percebeu o que ele teria de material de denúncia.

(...)

*As imagens foram gentilmente cedidas pelo repórter fotográfico.
** Quem desejar ler o artigo completo, deixe um comentário com e-mail.

Notas:
1 Especialista em Comunicação e Educação (2007) e graduada em Comunicação Social pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) em 2002.
2 FREUND, Gisele. “A fotografia de imprensa”. In Fotografia e Sociedade. Tradução de Pedro Miguel Frade. Lisboa, veja, 1995 (p.106-111).
3 FREUND, Gisele. “A fotografia de imprensa”. In Fotografia e Sociedade. Tradução de Pedro Miguel Frade. Lisboa, veja, 1995 (p.115)
4 Pesquisa na internet no blog Brasil contra a pedofilia.
5 BARTHES, Roland. “A mensagem fotográfica”. In Teoria da Cultura de massa. Introdução, comentários e seleção de Luiz Costa Lima. Rio de Janeiro, 1978 (p. 303).
6 Idem (p. 305)

27 de maio de 2010

CACOS LOUCOS


ESFARELAR-SE - O ofício da escrita e o exercício do doar-se. Texto de maio de 2003, reeditado. | imagem: Paraíso Niilista

VALDÍVIA COSTA

Pedaços de mim por todo lugar... Não, não fui esquartejada. Sou um ser que distribui partes de ansiedade e expectativa, procurando outros adesivos que colem novos gostos e atitudes. Sou uma mala surrada, marcada com adesivos de todos os países onde já estive.

Cada pedacinho, uma história. Assim gosto de mim, distribuída. Nada é mais monótono do que imaginar-me por completo. Eu almejo ser. Eu me descolo do velho e tomo, em goles largos, as novidades que o universo recria.

Reciclo-me. Distribuo atenções, afagos, sorrisos. E sinto uma esmagadora falta de algo que ainda não surgiu. Imagino-me dona de todas as explosões: cada partícula, uma pequena lembrança do meu existir. É no caos onde mais me demoro.

Sofro com as restrições. Uso uma caneta para demarcar meus triunfos e desconçolos. Calcem meus desmantelos, mas não deixem rastros inapagados. Rotulem meus improvisos, mas não repitam nomes. Quando o dia estiver cansado, eu amanheço. Quando a noite recusar a boemia, eu esperarei outra lua.

No mais tardar, aquele pedaço de mim, chega e instala-se por alguns instantes. Pede arrego no marasmo de qualquer canto. Sombria é a sensaçao do desconforto que causo. Retorço-me e saio, deixando a porta entreaberta para não acordar os outros.

Quantos pedaços? Nem sei! Reparto-os ao acaso. Sem medir os tamanhos ou destiná-los a um só endereço. Cacos loucos. Moucos são os poucos que eu toco. Se atraem por essa distribuição farta de estilhaços aparentemente inúteis. Nas teias de aranha, partículas minhas se prenderam.

Até nos dias em que fui má ou intragável, deixei parte de mim nas paredes. Tenho a pertubadora sensação que nada é real e tudo pode mudar a qualquer momento. Por isso, reparto-me em zilhões. Não há dúvidas no meu doar-se. Afinal, para que servimos se não para nos entregarmos?

26 de maio de 2010

ESMOLAMBADO


ATADO: Quando o sentimento enfraquece e a vontade passa. | imagem: Xibalba Mannequins

VALDÍVIA COSTA

Não existe amor sem liberdade. Quando somos esmagados pela opressão ou pela dominação, o amor arruma as malas e muda-se. Antes disso, ele morre um pouco. E nesse estado de moleza, de lentidão e de constatação do fim, o sentimento não sorri dentro das pessoas.

Enquanto driblamos o ponto final numa relação, seja ela qual for, em que grau ela estiver, nem a dor se instala de vez, nem se dissipa de vez o sentir. É nessa confusão de estado que a pessoa resseca as mãos e a pegada muda. Às vezes saem palavras ásperas das pessoas que não sabem mais amar. Logo quando esperamos calor humano!

Do lado de quem sofre assim, muitas vezes, o amor adormece, aquietando a ansiedade de explicações para o existir. Mas o mais comum é o conformismo fluir pelo sentimento de estar aprisionado a uma vontade sem sentido.

Acordar do marasmo que a vida se tornou é preciso. Por isso arquitetamos friamente essa morte prolongada e enterramos, em algum lugar inativo do corpo, esse amor que nem morre, nem vive mais. A reação causada nos torna intolerantes, mesquinhos, como monstros famintos e insatisfeitos.

Com o fim premeditado, o sentir contorce-se na rejeição. Projetamos no outro a salvação do que antes era bom sentir, do que antes reinava absoluto. Mas nesse momento é tarde para sentimentalismos. Logo achamos um brinquedo que nos dê prazer equiparado ao amor e esquecemos seus moldes.

Apagamos lembranças e ficamos assim, esmolambados por dentro, arrumando a casa por fora. Fedendo em insatisfações no interior, não suportamos a solidão. Temos a eterna sensação de possuir um inquilino fantasma assombrando a vida. Embora alegres por estarmos nos libertando, soltando os ferros dos pulsos para a verdade solitária.

23 de maio de 2010

DOMINGO: RECARREGUE A BATERA

VALDÍVIA COSTA

Vinnie Colaiuta, John Patitucci & Chick Corea


Um domingo ensolarado lembra uma canção alegre e saltitante. Daquelas que a batera lidera no funk ou no soul ou no groove... E você sai, procurando uma pessoa pra dançar, aproveitando o dia, mergulhando no ritmo, esquecendo tudo, até o bom não importa, só o som...

Dennis Chambers & Tony Royster


Qualquer visual azul, verde exibido, é leveza na alma. Andar assim, despreocupadamente, pensando nos sons que ouviu pela enésima vez de tão aprisionador do gosto, é importante. As energias vão se recarregando, como as baterias dos celulares, MP4s, máquinas fotográficas. Todos, nos carregamos no domingo.

Dave Weckl Band


Levante do sofá, não ligue se os vizinhos foram pra praia e lhe esqueceram, nem se empolgue se algum programa televisivo anunciar bundas ou pernas gostosas. Se entregue aos sons. Baterias carentes, loucas pra tocar loucuras pra você delirar. Recarregue-as! Se ligue nas nuances. Improvisos, quebradeiras que as bateras dão. Ouça o diálogo delas com os baixos e cante baixo com a cabeça. É domingo. Deixa a música banhar-se em você.

21 de maio de 2010

IGUAIS


CONFLITO - Uma confusão entre ser igual e diferente, ao memso tempo, como na novela mais famosa de Franz Kafka, A Metamorfose: "quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranquilos encontrou-se em sua cama matamorfoseado num inseto monstruoso". | imagem: Paraíso Niilista

VALDÍVIA COSTA

Nós não nos aceitamos diferentes porque somos iguais. Escorregamos os olhos no outro, de cima à baixo, voltamos o olhar pra nós mesmos e não nos conformamos como diversos. Não somos todos iguais?! Homens, todos machões; mulheres: todas feminininhas? Por que não somos felizes?

Viver uma sociedade etnicamente híbrida é uma quimera. Corre sangue português, índio, negro, holandez em nossas caras, mas só queremos nos ver brancos. Só procuramos, em reuniões sociais, os iguais. Seja pela cor, forma ou vestimenta, nos atraimos. Quando o casal se apresenta alto e baixo ou rico e pobre, logo ligamos o pensador autômato: "isso não vai dar certo".

É como se quiséssemos nivelar o gosto ou a atitude preconceituosa com a estética mórbida de pasto com ovelhas soberanas monocromáticas. Ou como se uma única raça gritassse dentro de nós: "Hay, Hitler!" e nos guiasse, esse brado, a um genocídio imaginário de seres humanos distintos de nós.

Aqui no Nordeste, quando vemos, por exemplo, um homem educado, com delicadas maneiras, o taxamos de gay. Porque nossos hábitos cangaceiros, até familiares, nos moldaram delimitadamente para processar uma única forma de ser homossexual e uma solitária maneira de ser hétero.

Sendo que, com a globalização, cansamos de ver que as estéticas, performances e tendências de cada sexualidade, unclusive as denominadas mais recentemente, como a pansexual, mudaram, entrelaçaram-se numa gigantesca e colorida hegemonia indestrutível.

Mas nós, seres limitados no pensar e no agir, continuamos de olhos e ouvidos fechados, tal qual nossos avós, a um século atrás. E o pior: temos internet, essa rede que conecta tudo no mundo, mostra-nos os avanços e nos reeduca nessas posturas rígidas.

Vemos os transportes, ruas e meios se adpatando à realidades diversas, como com os cadeirantes. Mas nós, humanos desinteressados por humanos distintos, fingimos que eles não existem. Nos assustamos quando um surdo se comunica conosco. O que dizer para alguém que fala com o olhar? A mesma coisa é com o homem elegante quando a mulher determinadamente masculina o discrimina.

Se temos carro evitamos amizades com quem caminha. Se somos "bem relacionados" desviamos o olhar do instrospectivo. Se bebemos, não andamos com quem fuma. Se o amor nos falta, taxamos a doçura de exagero meloso. Somos, eternamente, insatisfeitos com nós mesmos e com os outros. E somos iguais, mas de diferentes jeitos.

Sentimos olhares escaneadores recusando nossas posturas, nossas ideias. Deve parecer estranho ser do contra, para quem assim não é. Mas não mordemos. Só nos confundem, esses pensamentos discriminativos. Como bem narrou Franz Kafka, "...mas Gregor não tinha a menor intenção de causar medo a ninguém...".

17 de maio de 2010

VAMOS AO VERDE TOP BLOG 2010


RECICLE - A palavra de ordem do mundo agora é esta, reciclar, já que o planeta está todo sujo, cheio de lixo e tossindo larvas de fogo. | imagem: Top Blog


VALDÍVIA COSTA

Enfim, estamos novamente no prêmio Top Blog 2010. Este ano, o tema já é bem recorrente deste blog: "eu vivo mais sustentável". Casou bem! E tomara que a união seja prolongada com, pelo menos, a chegada a um Top 5, quem sabe? Contamos com aquela votadinha, ali no canto esquerdo, no selo verde. Leitores + sustentáveis fazem intelectoecologia e reciclam lixo até que a Terra respire, verde.

A jardinagem pessoal e intelectual é muito importante. Por isso, aí vai uma receitinha pra curar a doença que é jogar lixo pra fora de casa. Sabe aquelas garrafas de vidro que ficaram da cervejada de ontem (depois da vitória do Treze no Campeonato Paraibano)? Está na hora de aprender a fazer algo criativo e útil pra que elas não sejam jogadas no mundo. Sebe quanto tempo a Terra leva pra 'digerir' o vidro? Cerca de 5 mil anos, segundo o Vilabol. É demais não pensar na hora de descartar o vidro?

Feito basicamente de areia, calcário, barrilha, alumina e corantes ou descorantes, o vidro é um produto natural vastamente aplicado em nosso dia a dia devido a propriedades como transparência, dureza, impermeabilidade, baixa condutividade térmica e durabilidade. Além disso, o vidro não reage quimicamente com outras substâncias, o que lhe permite ser usado para armazenar alimentos sem que eles sofram alteração de sabor, odor, cor ou qualidade.

A reciclagem do vidro – um material não biodegradável - é geral, ele pode ser utilizado infinitamente, sem perda de qualidade ou da pureza do produto. Outra vantagem torna o material atrativo: pode voltar à produção de novas embalagens e produtos. Isso substitui totalmente o material virgem sem perda alguma de qualidade. Dessa forma, um quilo de vidro pode produzir outro quilo de vidro, com perda zero e sem poluição para o meio ambiente.

A cada 10% de caco de vidro utilizado na mistura economiza-se 4% da energia necessária para a fusão nos fornos industriais e reduz 9,5% do consumo de água. Por isso a importância de separar garrafas, frasco e potes em geral, como cosméticos, alimentos, bebidas e outros produtos. Depositá-los nos coletores específicos para vidro (identificados com a cor verde), também é uma sugesta. Separá-los de acordo com a cor (incolor, verde e marrom/âmbar) faz parte da reciclagem.

Leia mais dicas do vidro no blog Eu vivo + sustentável

OS INDICADOS - Veja as datas da votação globalizada do prêmio Top Blog 2010. No Júri Popular, o período de votação do PRIMEIRO TURNO para o internauta é do dia 6 de maio deste ano, às 02:00pm, até o dia 6 de outubro, às 11:55pm, horário de Brasília-DF. Neste turno quem seleciona e indica por meio de voto eletrônico é o internauta representando do Júri Popular. Nesta fase são selecionados os TOP100 (100 blogs em cada grupo e categoria que receberem o maior número de votos).

Encerrada a votação desse primeiro turno, no dia 7 de outubro, será divulgada no site do Prêmio a lista dos 100 blogs mais votados em cada categoria de cada grupo, por ordem alfabética. Caso não tenham 100 blogs entre os votados por categoria, serão exibidos quantos blogs tiverem votos. Já OS FINALISTAS é o SEGUNDO TURNO de votação para os júris Popular e Acadêmico. O período de votação pela Internet e avaliação pelo Júri Acadêmico é do dia 10 de outubro de 2010, às 02:00am, até 10 de novembro, às 11:55pm, horário de Brasília.

14 de maio de 2010

SEXO NA PRAIA É ROCK


DESTEMIDOS - Cavaleiros modernos, com seus instrumentos afiados, soltando a surf music de Campina Grande para o resto do Brasil. | imagem: divulgação

VALDÍVIA COSTA

Num mar de jovens preocupados com a chapinha do cabelo, embalados pelos sons eletrônicos, o rock and roll elevou um grupo de rapazes ao status de referencial artístico em Campina Grande-PB. Profissionais, esses três rapazes da instrumental Sex on the Beach, Marlo, Diogo e Tonny, em pouco mais de um ano de trabalho conseguiram fechar a primeira turnê de oito shows pelo Centro-Oeste e Sudeste do Brasil, além da Bahia nordestina.

O que eles tocam? A autêntica surf music da Serra da Borborema. O estilo, como o integrante Marlo Simaskowsk disse, é mais antigo que tudo. Mas imaginem, a praia a mais de 200 quilômetros de distância, e o surf reinando na cabeça deles. Isso gerou coisas legais como o EP Wanna some Sex On The Beach? e até um tímido baião na versão da Misirlou, "música mais famosa da surf music, feita por Dick Dale", como descreve Marlo.

É assim. Quem tem juízo e usa, cria. E juntando "criaturas abonináveis, com gostos que variam desde Chapolin à Laranja Mecânica, de Ventures à Surf Coasters, dos Mutantes à Ska", já dá pra fazer um caldo encorpado. Se liguem que hoje, dia 14, essa banda estará no Bar do Tenebra, em Campina. Vocês verão que Marlo (foto) e os colegas não deixam a desejar na técnica e na arte.

DE ACORDO COM "- A impressão que dá ao conhecer o trabalho de vocês é que é algo novo, mas de uma maturidade que nem combina com os integrantes, artistas jovens. Contem como foi montar um trabalho musical diferenciado dos demais existentes e o primeiro de surf music da cidade. Como surgiu esse lance de organização e profissionalismo logo na primeira banda?

MARLO SIMASKOWSK - A partir do momento que você pensa em fazer a sua música, naturalmente ela se torna diferenciada. Todo mundo é diferenciado. Quem colocar as mãos em alguma coisa, normalmente diferencia a mesma. Claro que não é tão simples assim. A música nasce do instinto, da criatividade, da inventividade, do poder de transformação e organicamente da imaginação. Poderia citar aqui infinitas influências para um trabalho diferenciado. Em sua maioria, todos levam à mente. Levam ao pensamento. Formulamos um conceito e tentamos executar. Mas não necessariamente tem que ser assim. Por exemplo, muitas vezes instintivamente executamos algo numa jam e depois temos o conceito formado sobre o que foi feito. Temos as nossas impressões e nosso contexto. Os conceitos existem e são infinitos por natureza. Sempre estamos buscando saber mais dessa infinidade. Talvez seja esta a diferença, e por consequência, um trabalho musical diferenciado. É assim que funciona. O surf music não é novo. Dentro dessa linha existem bandas que acabam dando o seu toque ao que fazem. A maioria, bandas excelentes. Percebemos que fomos a primeira banda de surf music da cidade (e acredito que das poucas da Paraíba) quando o bonde já estava andando. Formamos a banda e depois nos disseram que a coisa aqui era "nova". Esperamos que venham outras bandas. Assim, podemos fazer um Festival de Surf Music na Borborema. A prancha a gente compra. O mar a gente imagina. Falando mais sobre a banda, acredito que a organização e o profissionalismo surgiram dentro da pespectiva de sempre melhorar. Eu, o Diogo e o Tonny já passamos por diversas bandas. Eu tinha uma banda em Aracaju-SE, Diogo teve outra em Maceió-AL e o Tonny já participou de inúmeras bandas e projetos aqui na Paraíba. Ou seja, sempre somamos experiências. Acertos e erros. Logo, a organização se torna natural.

" - As críticas de música ao Sex on the beach também são positivas. Poucos conseguem, em pouco tempo como vcoês, ter visibilidade nacional, engajados numa turnê com oito shows diários pelo Centro-Oeste e no Sudeste brasileiros, além da Bahia. Qual o caminho que vocês escolheram pra fazer circular esse primeiro trabalho e quais as vantagens dele? Como surgiu a oportunidade de agendar oito shows pelo Brasil?

MS - Escolhemos vários caminhos. A internet, sem dúvida, foi o caminho principal. Sempre circulamos nosso material pela rede, disponibilizando para o download e para o streaming. Sempre entramos em contato com produtores, casas de shows e outras bandas através dela também. A vantagem disso é que você sabe exatamente onde e como está pisando. Dá pra ter um certo controle dos passos. A oportunidade de fazer esta turnê surgiu através dos nossos contatos com o Circuito Fora do Eixo. Através dessa grande rede de produção e artistas da música participamos também do Festival Grito Rock em Recife-PE, Maceió-AL, João Pessoa e Campina Grande. Já apoiávamos o Circuito desde o começo, participando das reuniões virtuais.

" - Falem um pouco sobre o primeiro EP, o Wanna some Sex On The Beach?, como ele foi produzido? Como e quando será a gravação do CD?

MS - O Wanna some Sex on The Beach? foi só um gole do drink. Gravamos de maneira bem despretenciosa. Estávamos fazendo shows com as nossas músicas e muita gente nos procurava para poder ter as músicas. A gente também precisava de um material gravado para poder nos ouvir melhor. Chegou um momento que queríamos apresentar a banda para outras pessoas de outros lugares e não tínhamos o material. Então, tinha chegado a hora de gravar. Fizemos um show para arrecadar uma graninha mínima e suficiente para fazermos uma gravação aceitável. Numa tarde, entramos no estúdio e gravamos as músicas, todas ao vivo. Como a grana era curta, gravamos rápido e mixamos rápido também. Para a gravação do próximo trabalho será diferente. Já estamos produzindo o nosso CD. Não temos data ou mês de lançamento. Ainda não dá pra prever. Mas não queremos alongar. Setembro foi o prazo médio no calendário que a gente deu. As águas rolam daqui pra lá. Pode ser que seja um pouco antes ou um pouco depois. Entramos no processo de composição de algumas faixas e na formulação de alguns temas. Outras faixas que não gravamos no primeiro EP irão entrar no CD. Toda a construção desse disco está sendo feita no estúdio do Natora. São muitas ideias, sons, conversas, opiniões e discussões. Estamos bem satisfeitos com as novas músicas. Quando tivermos com quase tudo montato, provavelmente faremos a pré-produção no estúdio 24h, lá em Jampa, com o pessoal do Burro Morto dando uma força. Não sabemos ainda onde vamos gravar. Música independente é assim. Pode rolar algo bacana e viável financeiramente...como pode não rolar. Estamos prontos para os dois.

" - Com gostos e estilos diferenciados, a surf music foi o elemento comum entre vocês ou vocês escolheram por nunca ter sido feito na Paraíba? A banda fala em variar o estilo, mesclar com outros ritmos mundiais ou vai manter o bom e consagrado rock and roll?

MS - O surf music é um dos elementos em comum entre nós. É difícl alguém não conhecer um tema de surf music. Podem não saber de quem é e o que é surf music, mas com certeza muita gente ouve ou já ouviu, nem que seja uma música ou outra perdida. Fizemos surf music, inicialmente, de maneira despretenciosa e acidental. Na pura vontade de se divertir. Depois que estávamos fazendo, vimos que éramos "pioneiros" nessas bandas. Não descatamos a possibilidade de colocar outros ritmos no nosso som. Aliás, nós já flertamos com outros ritmos. Fizemos uma versão da Misirlou, música mais famosa na linha surf music, feita por Dick Dale, onde colocamos um pouco baião nela. Incluímos Jazz e improvisos e outras faixas também. Naturalmente as coisas vão surgindo. É improvável que a gente deixe o bom e consagrado rock in roll de lado. Com certeza não vamos deixar. É a nossa veia praticamente. Mas no sangue de cada um existe outros elementos. Nos momentos certos estamos mesclando. Acredito que essa mescla não vai ser um elemento permanente ou que será a tônica das nossas composições, mas sim upgrades interessantes e divertidos.

" - Vocês também inauguraram, com o Natora, o ramo dos coletivos de arte e cultura da cidade, visto que nenhum ainda tinha sido oficializado. Como está sendo pra banda participar dessa cadeia produtiva da música nos moldes que as feiras internacionais pregam, com a união e a divisão de tarefas nos eventos de música, por exemplo? Quais as tarefas que vocês executam enquanto coletivo e como a banda participa das iniciativas?

MS - Foi uma adaptação tranquila, rápida e natural. Antes do surgimento do coletivo e de nós mesmos sabermos da existência das redes colaborativas, nós já trabalhávamos de forma semelhante a elas. Descobrimos que várias outras pessoas espalhadas pela nossa cidade, estado e país também trabalhavam da mesma forma que a gente vinha trabalhando. A tendência foi se aproximar cada vez mais destas pessoas e se unir. Estamos diariamente conectados com as bandas do coletivo e com bandas, produtores e músicos de outros estados. Com todo mundo e um objetivo em comum, a coisa tende sempre a crescer. A banda é organicamente do coletivo. Trabalhamos para a banda e trabalhamos para o coletivo. Dentro da banda, temos tarefas divididas. A nossa participação no coletivo também é assim. Eu sou responsável pelo núcleo da Agência Natora, o Diogo pela Distribuição Natora e Tonny pelo Natora Eventos. Como estamos em contato quase todo dia, acaba que cada um sempre ajuda ao outro. Somos responsáveis por alguns núcleos do coletivo mas trabalhamos em praticamente todos os núcleos. E isso não funciona apenas com a Sex. As outras bandas e pessoas envolvidas no Natora trabalham também desta forma. A hierarquia é horizontal e os melhores argumentos sempre vencem, da maneira a mais democrática possível. Inclusive este site é um espaço democrático. Sendo assim, quem quiser perguntar ou discutir algo, não hesite em digitar na área reservada aos comentários. Conversando nos entendemos.

SEX SHOWS

DIA 15, 23H50 - BRONX - CAMPINA GRANDE-PB (+ TONINHO BORBO)
DIA 20, 22H00 - FESTIVAL MARTELADA - BRASÍLIA-DF
DIA 21, 22H00 - FESTIVAL BANANADA - GOIÂNIA-GO
DIA 22, 00H00 - FESTIVAL GOMA - UBERLÂNDIA-MG
DIA 23, 00H00 - INVASÃO PARAIBANA - UBERABA-MG
DIA 25, 00H00 - BELO HORIZONTE - BELO HORIZONTE-MG
DIA 26, 00H00 - INVASÃO PARAIBANA - MONTES CLAROS-MG
DIA 27, 21H00 - VILA SEBO CAFÉ - VITÓRIA DA CONQUISTA-BA
DIA 28, 22H00 - BOOMERANG - SALVADOR-BA

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13 de maio de 2010

SALVEM O CINE SÃO JOSÉ!


RETOMADA - Toda a galera que trabalha com arte e cultura está se reunindo na frente do prédio abandonado, alguns com a velha cadeira trazida de casa, pra assistir as produções audiovisuais da Paraíba e do Nordeste. A semana foi de intensa atividade no local e de reivindicações de tomada do prédio pra um laboratório de cinema e teatro da faculdade de Comunicação Social (UEPB) | imagem: divulgação

VALDÍVIA COSTA

Antes, ameaçaram fazer uma ocupação cultural do espaço. Agora, uma grande mobilização foi formada e, pelo menos a frente do prédio, já serve de vitrine para filmes. Falo do Cine São José, um sessentão decadente, meio banguela e desarrumado que só serve de abrigo pra o consumo de drogas. Localizado no bairro São José em Campina Grande-PB, o prédio é alvo de disputa dos universitário, ativistas e defensores do cinema. Eles querem tornar o patrimônio histórico "guardado" pelo município num cine-teatro da UEPB.

O projeto formulado por várias entidades como o Moinho de Cinema da Paraíba, Sindicato dos Jornalistas e CA de Comunicação Social, pretende fazer do Cine uma extensão do Departamento de Comunicação. A ideia é transformar o Cine São José em um espaço produtivo, onde os alunos possam realizar laboratórios e projetos artísticos para a população.

Áureo - Segundo material informativo distribuído pelos mobilizadores, faz 40 anos que o prédio está estagnado. No fim da década de 90, os universitários também se manisfestaram. Em alguns anos, a prefeitura conserta algumas coisas, limpa o prédio por fora e, passados meses de inatividade cultural, tudo volta ao silêncio e as pessoas voltam a esquecê-lo como patrimônio público.

O Cine São José foi construído em 1945, no pós-guerra. Na estréia, o filme exibido foi "Sempre no Meu Coração". Nas sextas-feiras exibiam um seriado e o cinema lotava.
Os anos 50 e 60 no Bairro do São José foram de uma efervescência cultural, social e intelectual que praticamente é obrigatório o lugar voltar a funcionar.

Até os anos 80, o prédio exibia o que a TV ainda não mostrava. Mas agora, com a imensa produção audiovisual que a cidade e o Estado está colocando em festivais de cinema do mundo todo, o Cine precisa ser reativado como um local de artes. O projeto atual da PMCG é reformá-lo, junto com o Cine Captólio, tornando-os Centros de Cultura.

Luta - Contudo, os mobilizadores pedem a liberação do prédio para quem, de fato, faz cinema. Escolas de Comunicação se unem às artes. A faculdade daqui quer, também, produzir artes. Um laboratório como o Cine é o começo.

Para enfatizar a luta, os coletivos que estão no local pedem a participação de todos "os que acreditam e defendem a cultura popular da Paraíba". Vejam a programação e passem por lá amanhã, que tem novidades cênicas para serem apreciadas.

Programação
Dia 11 – Terça-feira
8h30 – Ato público pelo Cine São José;
18h00 – Projeção de filmes;
21h00 – Vigília protesto pela tomada do Cine, com o Sarau Poético Poesia em Cena.

Dia 12 – Quarta-feira
20h00 – Projeto Moído, do Moinho de Cinema da Paraíba, com "Cinema Paradiso" e outros.

Dia 13 – Quinta-feira
18h30 – Projeção de filmes na fachada do Cine São José.

Dia 14 - Sexta-feira
18h30 – Apresentação do Maracatu "Maracagrande" na fachada do cine
20h30 – Intervenção, curso de formação de Atores.
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CONTATOS: 8832.1276 / 8734.4684 / 8858.0766 | cineteatrosaojose@gmail.com

12 de maio de 2010

SURDA LÂMINA


EXPRESSIONISTA - A imagem do sentimento retido ficou pertubadora na xilogravura do carioca nascido em 1895, Oswaldo Goeldi (acima, Abandono), que teve importantes relações com um dos expressionistas da chamada "primeira geração", pré-guerra: Alfred Kubin, genial gravador e desenhista que participou d'O Cavaleiro Azul, o seminal grupo no qual estavam Wassily Kandinsky e Franz Marc. Texto indignado, depois das mortes de moradores de rua em setembro de 2004, como nesta semana. | imagem: Revista Carcasse

VALDÍVIA COSTA

Zombou o bruto do fraco pela falta, completa escassez, de subterfúgios rudes ou atitudes truculentas no indefeso. Primeiro o fogo que consumiu tantos nas calçadas-abrigos. Depois os tiros, embaixo do viaduto. A agressividade foi a mola propulsora para o assassino sentir-se bem. Sua ignorância hospedava um ser traiçoeiro que faria qualquer um estrebuchar de raiva: a leviandade.

Dias e noites pra uma pessoa desprovida de sensibilidades eram chagas abertas que doiam e inflamavam com cenas de amor e alegria. Para ele, sorrir soava falso. Ninguém entendia que seus modos bruscos e seu linguajar intimidativo envoltava um desespero desconhecido, apesar de natural em seu íntimo.

Se não o julgassem tanto de criminoso teria certeza de estar agindo certo. Em entrevistas imaginárias a uma televisão futurística, que daria espaço ao acusado, diria que a violência aplicada em doses certas e precisas era o antídoto de todas as mazelas do mundo. "Para um mendigo sem nenhuma perspectiva de vida, não seria um alívio a morte através de um único golpe?", questionaria o assassino à repórter gostosona.

"E o que você me diz da da sensação frenética e orgâstica de destrinchar víceras e pele de alguém que não merece viver por ser pobre?", pensaria a repórter sabichona, sem perguntar por aí. O medo havia recuado quando a jornalista encarou nos olhos a dupla personalidade daquele justiceiro às avessas. Mas ela não conseguiu pegar a fala em que ele descreve o regozijamento que sentiu ao matar miseráveis.

Mulheres, crianças, animais e até estruturas públicas encaram esses assassinos diuturnamente, viram alvo para sua surda lâmina. Tacapeando certezas claras demais em suas cabeças confusas de psicopatias salientes, esses sujeitos enaltecem suas situações de ódio pelo humano sujo, matrapilho, que enfeia as cidades. Momentos em que o homem se deixava vencer apenas pelo seu estado torpe de brutalidade.

Mesmo entre jornalistas e psicólogos, esse ser carregado não informa, direta ou indiretamente, que bicho se apossou do ser humano para matar semelhantes inofensivos. Nem a pior das feras mata sem o intuito da caça, da disputa ou da própria sobrevivência. Nós, bichos racionais, somos herdeiros da febre alucinante dos loucos homicidas. Carregamos esse desejo de sufocar a vida do outro.

Tudo denuncia a barbárie. O caos sentou sua poeira densa na calçada dos desabrigados. Uma população esquecida, embora proliferada; invisível, mas útil nesses anos eleitoreiros. "Somente quando penso em fazê-los notados é que me culpam e me julgam pela butalidade", pensa o assassino, engrenagem rota do nosso mundo.

11 de maio de 2010

PORÕES, LABIRINTOS E SEQUELAS


DESCOBERTA - Momento em que o homem descobre-se calculista além da caçada; visão romântica de uma jovem numa tarde melancólica de outubro de 2004. | imagem: Paraíso Niilista

VALDÍVIA COSTA

Queria eu entender porque acelerei demais! Deixei que o orgulho atropelasse meus instintos e segui, como uma catraca que funciona velozmente acionada, engatada em outras mil de vários tamanhos. Olhei ruas como metas. Nem beleza nem dor estancaram meu desejo selvagem de seguir um objetivo, uma caça.

Questionamentos não supriram o enorme vácuo que estava criando a minha volta. Porões, labirintos e sequelas se estendiam na minha soterrada consciência. Cada vez mais uníssono, meu discurso não cessava. O que me movia era a voz quase viva do engano, como letal esfera da loucura ou do abandono.

Para chegar até mim, as pessoas tinham que atravessar imensas crateras de indiferenças. Meu olhar rápido percorria, desinteressado, as faces. Eu nunca parava para observar uma nudez celeste. Onde investir meu tempo, no sóbrio e real desejo passageiro das manhãs ou na solidão que aliciava-me de noite?

Não vejo sentido no sentir e amar pode ser clausura ou golpe que antecede uma fria e longa exposição ao fracasso. Poços, pinças e passadiços... Não me importo. Cada um fica indignado com aquilo que lhe parece injusto. E não pude mais fingir que no mundo tudo era bem cuidado e perfumado.

Eu próprio esfacelava meus delírios febris de forma inescrupulosamente fria: um vago adeus e um meio sorriso. Hoje acordei pensando no que pedir de presente de Natal. Me deu vontade de abrir as cortinas e sorrir pra minha existência.

10 de maio de 2010

BIGODINHO AMEAÇADO


TOCAIA - Aves alegres e diversificadas são esperadas pelos traficantes de animais, flagrados caçando indefesos como o bigodinho, pássaro que se pega em armadilhas, como os outros, atraídos pelo canto das fêmeas, geralmente já engaioladas. | imagem: Aramy Fablício

VALDÍVIA COSTA

Um habitat que todos os tipos de animais procuram pra se reproduzir, na intuição natural de desenvolver a espécie. Assim é o Brasil, berçário tipológico. Tanta beleza e liberdade tinha de ser castrada e liquidada pelo homem. Começaram pelas aves, com a caça predatória. Desde a colonização, as araras mais raras se extinguiram, caçadas. Na Paraíba, por causa desse hábito egocêntrico de prender um canto de passarinho, espécies migratórias estão sumindo, como o bigodinho.

Quem constata o fato é o ambientalista Aramy Fablício, da cidade de Fagundes, no Agreste. Sem pesquisa formal, mas com conhecimento do território onde mora desde criança, ele notou que correm risco de extinção aves migratórias como o caboclinho lindo, o papa-capim, a chorona, entre outras, que vêm se reproduzir na Paraíba no inverno. Desde 1970, ele percebe que, a cada ano, diminui o número dessas migratórias devido aos caçadores, que comercializam clandestinamente.

Aramy ainda ressalta que os capturadores de aves estão cada vez mais sofisticados, com gaiolas de oito alçapões e redes que capturam de beija-flor a gavião. Para esses negociantes, o que importa é a quantidade e a biodiversidade de aves capturadas. O mais preocupante, segundo o ambientalista, é que capturas ocorrem no período da reprodução.

"O alvo dos predadores é o bigodinho. Com um canto alto e belo, e de uma plumagem que chama a atenção, o pássaro habita campos abertos e se alimenta de sementes de capim. Geralmente, ele sai do seu habitat para se alimentar e se reproduzir aqui no Estado. O bigodinho demarca seu território onde faz o ninho, por isso é alvo fácil dos humanos, que o vendem e o exportam para outros países", ressalta Aramy.

Ele denuncia que, para conseguir capturar as aves, os predadores aliciam moradores da zona rural com dinheiro. Alguns jovens deixam de estudar para capturar animais e vender. Alguns caçadores também vêm de Pernambuco. Muitos moradores já têm consciência e expulsaram traficantes. "Mas, em outras cidades, os habitantes não sabem da prática ilegal", lamenta.

O alvo dos caçadores não é apenas ave migratória, mas as nativas, como o quase extinto azulão nordestino, o galo de campina, o xexéu de bananeira e outras. Como forma de amenizar esse descontrole na fauna paraibana, Aramy chama a atenção das autoridades. "Os governos deveriam investir em políticas socioambientais, melhoria na capacitação dos policias florestais, criar concurso público com critérios que atraiam pessoas interessadas na causa ambiental", pontua.

BIQUEIRA VELHA - "Mesmo com fiscalização de crimes ambientais, se não houver conscientização da sociedade civil para não comprar animais selvagens, pouco vai adiantar", atestou Aramy. Pensando nessa desinformação da população, ele criou em Fagundes projetos ambientais como o Biqueira Velha. São placas de zinco reaproveitado de biqueiras (calhas), escritas "PROIBIDO CAÇAR E CAPTURAR ANIMAIS", nas propriedades rurais.

Hoje, a maioria dos camponeses do município e cidades vizinhas aderiram ao projeto. Isso diminuiu os crimes ambientais na região, segundo Aramy. O sucesso desse projeto é tanto que fez surgir outro, o Natureza Livre, uma área de soltura de diversos animais na zona rural de Fagundes.

BOA MÍDIA - "Os meios de comunicação têm grande importância na conscientização da sociedade. Na Paraíba temos bastante apoio da mídia para nos ajudar nas causas ambientais", enfatizou Aramy. As apreensões realizadas pelo IBAMA e outros órgãos ajudam, mas a melhor prevenção é a informação para não caçar nem manter animais em cativeiro. As escolas estão longe de cumprir o papel de agente conscientizador, "pois pouco se vê educação ambiental nas aulas", desabafa.

ORIGEM - O bigodinho (Sporophila lineola), conhecido como estrelinha ou cigarrinha, é uma ave passeriforme da família Emberizidae e mede 11 centímetros de comprimento. Vive em descampados, plantações e à beira de capoeira. É uma ave migratória no Espírito Santo e Paraná, aparece em dezembro para nidificar e some em março ou abril. No leste do Maranhão e no Piauí aparece apenas de maio em diante. Também ocorre das Guianas e Venezuela à Bolívia, Paraguai e Argentina.

Contato: aramy.fablicio@gmail.com | 83.9955.5534 / 8868.7218
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Colaboração: jornalista Edimilson Camilo

8 de maio de 2010

O PARAÍSO DAS GARÇAS É NO SERTÃO


OFF - As milhares de garças vaqueiras fazem um caminho parecido com o nosso, ao voltarem do trabalho pra suas casas (algarobas brancas na faixa mais amarelada - clique na foto) depois de um dia de luta pela sobrevivência. | imagem: Val da Costa

VALDÍVIA COSTA

Se chegar num lugar desconhecido causa certa ansiedade, Sousa, no Sertão paraibano, ganha de todos ao amenizar isso com um lindo visual verde agarçado. A chegada nessa cidade plana, quente e de desorganizados atrativos cedo da manhã ou no entardecer é arrebatadora. Somos recepcionados pelas garças vaqueiras. Aos milhares, elas ocupam as algarobas num açude do município de pouco mais de 60 mil habitantes. Um atrativo visual e sonoro bem envolvente que batizei de Paraíso das Garças.

Seguindo uma definição científica não muito confiável, mas disponível para uma primeira guia, da Wikipédia, a garça faz parte da família da Ardeidae, aves ciconiformes como os socós. Elas vivem aos bandos, frequentam rios, lagoas, charcos, praias marítimas ou manguezais de pouca salinidade. Se alimentam principalmente de peixes, sapos e outros animais aquáticos. A vaqueira, mais comum no Sertão, se alimenta de insetos.

Ave branca, de longas e elegantes patas alaranjadas. A garça enfeita nossos desenhos infantis com suas asas esguias sobrevoando uma casa, às vezes representada apenas por um V aberto, de linhas curvadas. Calmo é o voo da garça. Suave é seu pouso ao redor das vacas. Como colegas camponesas, as duas passam o dia inteiro trabalhando juntas.

A vaca executando seu papel principal, pastando, e a garça... é curiosa a forma como a garça associa-se ao bovino para comer, numa parceria mais do que higiênica para a vaca, comendo insetos que sobrevoam suas melecas e até seus carraptos. Não pesquisei com nenhum órgão ambiental, mas acredito que Sousa abriga milhares dessas aves.

Não dá pra vê-las muito bem nas imagens que fiz desse habitat, não tenho uma lente potente e o acesso ao Paraíso das Garças está muito precário, inundado de água, coberto de matagais, gigantescas e frondozas algarobas. Mas valeu estar em contato com bichos tão parecidos conosco na forma de trabalhar. Elas passam o dia na sociedade com as vacas, inclusive, muitas vezes, pegam carona no lombo desses animais pacíficos mogedores.

Por volta das 17h00, acontece a revoada. Todas, de uma só vez, levantam voo. E saem de recônditos pastos, dos mais distantes, se agrupam em pequenas revoadas e passam por cima de todos os caminhantes da entrada de Sousa. Uém, Uém, Uém... É o som da tarde que acompanha quase todas as cidades sertanejas. É o branco cobrindo o verde, acompanhando uma faixa amarelada que vai passando por cima das árvores, dando lugar a um sombreado anoitecer.

Sousa também tem uma história com os dinossauros. Mais intensa, viva (apesar da extinsão desses bichos pré-históricos), revigorada com apelo turístico, mantida por todos os sousenses com o orgulho de quem defende uma identidade. Tem sauro em todo lugar do município, ns praças, nos estabelecimentos comerciais. E o único vestígio dessa vida dinossáurica fica no Vale, em gigantes pegadas fósseis.

Outra relação entre a população e a garça, que ainda não se extinguiu, deveria surgir. Já que o lugar foi escolhido por elas, a cidade deveria protegê-las. Mas já soube por lá que não há nenhum interesse em transformar esse paraíso garçal em atrativo embelezante. Vejo o sousense ainda desatento pra essa relação natural. Já estão populacionando essa entrada da cidade.

O terreno da frente desse habitat foi loteado. Em breve será morada de gente. Gente que vai ser privilegiada diariamente com todo esse movimento garçal descrito aqui. Mas assim não pensa o homem. Só interessa seu conforto. Soube pelos caminhantes que o terreno onde fica o habitat, que é privado, cercado, inclusive, ia ser loteado como o da frente. Senti profundo pesar ao ouvir isso.

Fiquei pensando, triste, como viveriam essas milhares de pássaros tranquilos sem suas árvores, sem suas casas ao voltarem desse trabalho árduo e interminável pra um ser vivo que é sobreviver. Mas notei que essa minha sensibilidade era ingênua e solitária, ao ouvir um sousense dizer, no momento em que fotografafa: "atire uma pedra que elas voam... é lindo". Salve a selvageria humana!

3 de maio de 2010

AS SEIS IGREJAS E DARCY


ANALOGIAS - Entre o passado afro-indígena-brasileiro (provocadas em visita ao Centro Histórico da capital paraibana), e as reflexões sociais que pintam a religião como uma grande palhaçada para pobres, instrumentos de massificação pra construir cidades e hoje pra eleger políticos corruptos. | imagem: Val da Costa

VALDÍVIA COSTA

Ao observar seis igrejas pela janela do atual prédio do INSS em João Pessoa-PB percebi analogias anti excessos religiosos que não condizem com a bondade pregada pelas crenças. Cada uma igreja representa, no meu ver, a violência mortal, a intolerância, a prepotência, a ganância, a opressão e a humilhação que os índios sofreram em nome da mercantilização mundial. Tudo aconteceu nas ventas dos padres.

Onde estava a vigilância do mal? Que faziam esses "seguidores de Deus" quando viam o português enganando um inocente dos costumes do Velho Mundo? Amenizar essa história é esquecer do direito adquirido de andar pelada, por exemplo, e ter sido obrigada, sem motivo aparente, a usar quatro saias, duas blusas, meias, ceroulas longas e um calçado de bico fino com salto. (A vaidade feminina esmagando a beleza natural com o salto...)

Injustiça é pouco pra se designar tamanha brutalidade. Nem em 500 anos de liberdade, com todos os direitos físicos e abstratos segurados, recomporão a morte de, pelo menos, 300 aldeias indígenas destruídas no século XVI, só pra citar um das chacinas étnicas. Em todas as embarcações, as ordens religiosas mandavam seus representantes aos montes pra catequizar os "selvagens", como descreviam os primeiros portugueses à Coroa.

O branco europeu inseminou meio mundo de índia e eu descobri que é por isso que somos tão nojentos, às vezes. Meu lado bom é indígena. Meu lado duvidoso, arredio e calculista é do branco. Sou mista por causa da invasão dessa terra já chamada de Brasil antes de ser "descoberta". Fomos estuprados pelo europeu com o consentimento velado da Igreja, por manter representantes na colônia que viam tudo e nada faziam. Como ainda é até hoje nas cidades, com outras roupagens, mas a mesma proposta de dominação branca.

Por isso obedecemos. Sempre a quem pode mais. E poder hoje significa dinheiro, muito dinheiro. Difícil vermos essa corrupção brasileira sair dos tablóides internacionais. Mas alguém analisou porque o nosso país ainda não decolou, se já tínhamos características de riquezas materiais naturais mais do que qualquer outro país. Esse alguém é Darcy Ribeiro, que pode ser consultado diarimente pelo Youtube.

Vamos relê-lo urgentemente. Darcy conhecia a gente, o povo brasileiro mais do que tudo. Sejamos como ele, atento, curioso, quase um jornalista na apuração e difusão dos fatos ancestrais. Pois são deles que nascem nossas raízes. Entendemo-nos como pobres e ricos, mas, antes disso, somos humanos. Entendamo-nos, então, como tais.

1 de maio de 2010

MARKETING CRIA O HOMO DIGITALIS


IMEDIATO - As eleições de 2010 trazem novos e instigantes desafios, para candidatos, cidadãos e também para a Justiça Eleitoral, o que deixará o eleitor em contato direto com o candidato, via redes sociais virtuais, como para interagir com um deus. | imagem: Cibernetika

RISOLETTA MIRANDA

O Brasil já ficou famoso pelo sistema de apuração de votos que possui, por muitos reconhecido como o melhor do mundo. Somos frágeis, contudo, na gestão do processo político-eleitoral, debatendo-nos com regras muitas vezes confusas e antiquadas, numa época de transformações extraordinárias nos meios de comunicação. Por isso as eleições majoritárias e proporcionais de 2010 trazem novos e instigantes desafios, para candidatos, cidadãos e também para a Justiça Eleitoral. Dentre estes desafios destaca-se o de como ordenar capacidades, habilidades e responsabilidades de todos os envolvidos para integrar a comunicação clássica com todas as possibilidades do mundo digital.

Do lado do eleitor, em especial, trata-se da oportunidade de exercer sua cidadania na “Ágora” digital – as chamadas Redes Sociais –, onde a conversação, os diálogos, os testemunhos e a colaboração com certeza influenciarão milhões de votos. No Brasil, 56 milhões de pessoas acessam a internet. Destes, 47,5% o fazem por meio de lan houses instaladas em lugares onde antes existiam botecos. Esse cenário mudou a regra da comunicação. E será que 2010 vai mudar a relação do cidadão com seu voto? O quanto isso vai impactar o debate e o comportamento dos candidatos e o modo como eles se comunicam na política?

Como profissionais de comunicação corporativa, antes de irmos atrás dessas respostas devemos refletir sobre a angulação conceitual da internet e entender por que ela se tornou ponto de inflexão na recente história da comunicação. Um pré-requisito básico é compreender que o tema não se sustenta ou se apega à existência e uso de um portal, do Google, Twitter, MSN, Facebook, de blogs; das plataformas de comunicação digital, enfim.

Em outras palavras, estas tecnologias temporais – tão incensadas – não são foco único deste cenário de comunicação em permanente estado de fluxo. Elas são hoje apenas o veículo pelo qual – mais uma vez, como aconteceu no Iluminismo, por exemplo – o conhecimento cruzou a ponte para fazer um movimento de provocação criativa, de multiplicação do saber, nos levando a pensar em como integrar regras do jogo já conhecidas na comunicação com as novas que se expõem com a internet.

E o que são as novas regras? Chamam-se colaboração, inclusão e relacionamento em tempo real. São os ambientes comunitários, segmentados e capilarizados onde se fala com um e com muitos na mesma dimensão, dando vida à “segmentação de massa” pronunciada no início da web por Philippe Kotler. Como especialistas, aqui na FSB PR Digital naturalmente estamos incorporando esses conceitos do chamado PR 2.0. É o movimento – e o momento – para estudar e potencializar a convergência. Releases, redes digitais, anúncios, sites; as ferramentas estarão juntas, mas nem por isso deixarão de ser commodity.

O que não é commodity, para nós, é o compromisso intelectual de fazer um mix crível, inteligente e exequível, que funcione para nossos clientes. É aproveitar o conhecimento que nos formou lá atrás – desprezando seus itens obsoletos – e potencializá-lo com agilidade, aliando a credibilidade da comunicação clássica com o sentido de pertencimento da comunicação digital. É a hora de construirmos o amálgama. Essa consciência da trajetória do conhecimento é a base diferenciadora que nos permite atuar e entregar ao mercado planejamentos consistentes e estruturados, tanto de pensamento estratégico quanto tático, para atuar em comunicação corporativa.

Gosto de pensar que essa transição, que cria uma sedutora visão da comunicação, acelera e amplia a troca de conhecimento na construção de uma sociedade com cidadãos mais esclarecidos, mais questionadores, mais colaborativos e, por isso, mais felizes. É gente em vertiginoso exercício da vontade de se comunicar e de se posicionar sobre marcas, seus ídolos e desafetos, seus candidatos e suas causas.

É, afinal, o que poderemos ver neste 2010 de eleições: a política brasileira passando pelos olhares antenados de cidadãos conectados fazendo resplandecer esse novo cidadão. Bom isso, não?! Aos palanques, programas de televisão, folheteria e assessoria de mídia se agregarão a redes sociais com seu ambiente naturalmente inquieto, habitado por cidadãos conectados e questionadores em busca não apenas da informação, mas, o que é fundamental, de relacionamento. E uma das regras desse jogo será naturalmente o exercício do que os anglo-saxões chamam de accountabillity.

Ou, em uma visão mais pragmática: transparência e “cobrabilidade”. Que melhor oportunidade para a classe política do que esta? Será um grande desafio. Desafio que se inicia na visão da informação em sua trajetória multiplataforma. Porque, afinal de contas, há um caminho de transição entre o que pensa e como age o Homo sapiens na sua versão analógica – quase todos nós que migramos para o ambiente digital – e as novas necessidades do Homo digitalis, especialmente os brasileiros entre 16 e 35 anos, a massa da população conectada no Brasil.

É o caso de imaginar que há uma nova “ordem darwinista” na comunicação. Essa teoria nos ajuda a lembrar que, afinal, estamos falando de e para pessoas. No início, no meio e no final são pessoas protagonizando e produzindo conteúdo, construindo e desconstruindo posicionamento, imagem e reputação. Saindo da plateia onde eram coadjuvantes e adotando a resiliência e o ativismo dos protagonistas. O caminho do diálogo certamente passa por essa nova matriz da informação e do relacionamento horizontal, transversal e centralizado no indivíduo. E sempre é bom trabalhar com e para pessoas. Gente, essencialmente, gente. Gostamos de ter essa especialidade.

Esse artigo integra o relatório anual da agência FSB.

*Risoletta Miranda, diretora-executiva da FSB PR Digital