PARALELAS - Já vi tantas mortes, como vivo vendo a vida... tem horas que penso ser duas faces da mesma coisa... | Imagem: O alma anárquica
VALDÍVIA COSTA
Acho que juntei muita morte dentro de mim nos últimos anos. Mas a última dela, de um animalzinho de estimação, me fez pensar nas outras, até de seres humanos também. O que foi bom, mas me trouxe dois dias de profunda tristeza. Abundante, eu diria. Tudo porque senti firmeza na morte.
Simplesmente ela entra na vida, quando bem entende, e para tudo. Segundo o filósofo Platão, "a Filosofia é uma preparação para a morte". Acredito que, com o auxílio da sabedoria, o filósofo pode olhar para a morte de uma forma calma e não se agonizar perante o eminente fim.
Na infância, a gente fica com medo da morte durante muito tempo. Acho que devido a essa cultura tão cheia de mitos que o brasileiro passa de pai pra filho, de que existe um mundo depois desse material, como pregam as religiões cristãs. A transmissão de uma consciência a outra era o que me assustava. Como se dava isso? Eu não via carro nenhum levando uns daqui pra o 'outro mundo'... nem via naves espaciais também. Mas agora, a morte não me assusta mais. Ela continua me fazendo triste, inconformada com sua chegada.
Vejo a morte com respeito, mas não a aceito ainda. Como repórter policial durante uns três anos da minha vida pude notar que mortes por homicídio por exemplo, são curiosas. Despertam, além da dor, um misto de curiosidade e vingatismo nos parentes. Já a morte por acidente de trânsito é a mais incompreendida. Há também uma mistureba de sentimentos. O pior é o de estar aéreo. Parece que os parentes ficam meio autistas, por certo a esperar que alguém diga que foi tudo um engano.
Num massacre, por exemplo, o visual é forte, mas você aguenta. O pior é sentir o cheiro da morte nesses casos. Muitos repórteres policiais se instigam demais nesse universo. De investigadores criminosos (que muitas vezes faz o serviço pra polícia), se transformam em cães farejadores de sangue derramado por violência gratuita.
Morto queimado tem as duas coisas de horríveis: você vê e sente o cheiro da morte. E quando é criança a vítima, é mais forte o ímpeto de vingá-la. Não tem como você não sentir por alguém que nem descobriu o mundo onde viveu. Mortes violentas de idosos, indigentes e prostitutas, além dos animais de rua, são sempre drásticas e desdobráveis nos âmbitos judiciais, com as devidas responsabilidades aos que deveriam protegê-los. Mas a dor dura centenas de anos, corroborada pelo marasmo da esfera jurídica.
Todas presenciei. Embora que depois dos fatos acorridos, muitas vezes, uns cinco minutinhos após. O fim das coisas traz um pesar. Como nesses dias que passei sentindo. Até encontrei uma letra antiga e bem ansiosa em relação à morte, do Raulzito e Paulo Coelho, pra ninar essa tristeza que não quer dormir... Até reli Rubem Alves, no lindo texto A morte e o morrer, no qual ele questiona "o que é vida" e, mais precisamente, "o que é a vida de um ser humano? O que e quem a define?"
(...) Vou te encontrar vestida de cetim,"Canto pra minha morte"
Pois em qualquer lugar esperas só por mim
E no teu beijo provar o gosto estranho
Que eu quero e não desejo, mas tenho que encontrar
Vem, mas demore a chegar.
Eu te detesto e amo morte, morte, morte
Que talvez seja o segredo desta vida
Morte, morte, morte que talvez seja o segredo desta vida
Qual será a forma da minha morte?
(...)
Oh morte, tu que és tão forte,
Que matas o gato, o rato e o homem.
Vista-se com a tua mais bela roupa quando vieres me buscar
Que meu corpo seja cremado e que minhas cinzas alimentem a erva
E que a erva alimente outro homem como eu
Porque eu continuarei neste homem,
Nos meus filhos, na palavra rude
Que eu disse para alguém que não gostava
E até no uísque que eu não terminei de beber aquela noite...
Um comentário:
...tá vendo? a poesia se (re)conhece e per/segue, a de quintana que seguiu rubem que seguiu val que seguiu raul e coelho que agora eu e outros tantos seguem...
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