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22 de outubro de 2011

ENVELHECER

Muna, Neta, Val e Buíta | fotos de 2009: Robson Yam
Na família, temos momentos de profunda introspecção em que não nos identificamos com ninguém. Temos ainda tempos de desunião, de discordâncias irreparáveis e ainda perdemos tempo nas falácias, essas malditas coceiras da língua humana. Mas na velhice de alguém, as forças se encontram. Para suportar, para amar mais e melhor aquele ser que, depois de sua longa vida, está deixando a todos.

Passamos por isso algumas vezes, até chegar a nossa vez. Se eu não morrer por causa súbita, ou por crime ou por acidente, passarei pela velhice última também. Quem cuidaria de mim, na velhice? Acredito que meu filho. Mas como ele cuidará de mim? Dará para ele conciliar uma suposta vida atribulada de afazeres com minhas dores e desconsolos? A velhice é aquele filme que contamos sempre o final... Alguém, às vezes, se cansa de ouvir o mesmo enredo, de vê-lo se repetindo no passar da vida...
Muna e Val
Enquanto estamos concentrados, cuidando dos idosos em suas fases terminais, pensamos na nossa velhice. Vê, que egoísmo! Mas, somos isso: um poço. E cabe de tudo o que não presta dentro dele... Parece que as coisas mais amargas, mais desagregadoras, mais horripilantes, são as que mais vêm à tona nesse envelhecer.

Quando crianças, observamos o movimento dos irmãos, primos e tios cuidando dos mais velhos. Sentimos  compaixão, mas nem entendemos ao certo o que está se passando. Ainda temos muito amor no coração e até ajudamos aos mais velhos, com carinho, brincando e alegrando a casa para o velhinho.
Neta e Val
Mas, depois que crescemos, algo nos puxa para a responsabilidade de cuidar de tudo, de acompanhar, de decidir e de representar o velho. E essa tarefa num instante se mistura ao que é prioritário na nossa vida em particular. Porque cuidar de um pai, de uma mãe ou de um tio doente na velhice é dever, não é favor nem algo que se possa adiar.

Pena que muitos não enxergam assim e os velhos do nosso país sofrem. Ao invés de serem bem cuidados, com paciência, são, na verdade, maltratados. A negligência enterra mais um idoso do que a doença. E nem é como um simples sobrepor de obrigações cotidianas. Às vezes, pela simples inoperância sentimental humana. Ou pelo desapego com alguém que cuidou de você anos a fio, esperando seu crescimento, tanto intelectual quanto físico...
Neta e Buíta (mãe)
Triste, mas real... Olho para minha tia Muna, com seus 84 anos de resistência, e só vejo a nós, sobrinhos próximos, velando seu sono frágil. Agradeço muito por ter uma irmã como Neta, cuidadosa, responsável e, acima de tudo, forte. "A filha que Muna não teve"... Ela é a verdadeira fortaleza dessa família. Já cuidou da nossa avó Albertina, de quem herdou apenas o nome, do nosso pai José Geraldo, que sempre foi muito apegado a ela, e agora nossa tia Muna.

Nós, o restante da família, somos meros coadjuvantes. Nossas limitações (físicas e sentimentais) nos impede de fazermos algo mais, além de visitarmos, providenciarmos algumas pequenas coisas... Ela é quem acorda na madrugada, enfrenta as filas dos hospitais e as dietas dos nossos idosos. À Neta, eu devo meus sinceros agradecimentos e minha devoção. É isso que o trabalho com idoso gera. A prospecção do pensamento na nossa própria velhice. Mas traz também a certeza de amarmos mais a quem se dedica, diriamente.