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10 de agosto de 2010

MEU OURINOL DE OURO


DILUÇÃO - Em tempos de explosões magaloblásticas de novos ricos, a arte vai virar mais uma utilidade? | Hyeronimus Bosch: Plus

OCTAVIANO MONIZ#

De volta às letras. Elas me querem. Mas causam uma confusão infernal. Sobre? Arte é meu prato principal, sem espinhas, please, e garfos de peixe. Sou snob. Como todo bom artista. Não sofro da síndrome de Fabiano de Vidas Secas, que sabia ser um animal. De quatro patas. Por hora tenho duas e uma língua quilométrica.

Ontem no almoço, minha mãe, poliglota e culta, soltou a seguinte pérola: "arte é para decorar". Ativou meus neurônios e tentei explicar pela Teoria da Formatividade de Pareyson que ia mais além. Perda de tempo. E ela é antenadésima em design e moda, curte as tendências da moda e sabe que uma coleção de Dior envelhece rápido. Pois bem, assim é com a arte. O século XX veio à galope, as vanguardas se sucederam e hoje vivemos num pós tudo onde o conceito às vezes é mais relevante que a obra.

O conhecimento antes da expressão. O pior é que ela não está só aqui na Bahia, onde habito por ora. As galerias e decoradores se esmeram para achar quadros que façam pendant com as cortinas. Esculturas só de orixás para proteger a casa e seus rebentos. Vivemos ainda numa época pré-impressionista quando com o advento da máquina fotográfica o caráter de retratar o real perdeu a razão de ser.

Aqui não, o importante é a paleta de cores do pintor e o colecionador chega e pede um quadro verde que combine com seu papel de parede. Os artistas ainda estão coibidos de colocar suas impressões na tela, o que ocorreu em 1890 na Europa. Isto, como diria Hitler, é uma arte de degenerados, temos que ser fieis ao real. A fotografia é um hobby. Mega empresários saem em busca das pérolas da arte acadêmica baiana.

Enquanto Picasso estava devorando tudo com o cubismo, os artistas baianos, que chegaram a viajar ao velho continente, se esmeravam em ser uma máquina fotográfica made in China. Qualidade zero. As galerias da boa terra promovem leilões suntuosos, com salmão e whisky 18 anos. Acredito se algum estrangeiro que frequente o circuito das artes entrar pense ter entrado no tunel do tempo e vai surtar.

Artistas brasileiros como Hélio Oiticica, Lígia Clarck, Lígia Pape ou mesmo Beatriz Milhazes e Eduardo Berliner alcançam cifras que somado o total do leilão não chegam perto. Cada dia mais a arte neo concreta carioca é estudada e valorizada, exposta em museus de todo o mundo, mas escondida pelos marchands locais para não perderem suas viagens de navio de fim de ano, nem as temporadas de ski.

Até quando eles conseguirão enganar estes colecionadores? O que me causa espécie é que muitos viajam muito. Será que não frequentam a Saatchi Gallery, a Gagosian, O PS1 em NY, o Beaubourg em Paris e outras mecas da arte? Os artistas locais têm que se adequar e se quiserem ter vida boa tem que pintar com tons pasteis, aceitar encomendas que combinem com o vaso sanitário e fazer pintura decorativa.

Por isso, não tivemos nenhum artista chamado para a Bienal de Sampa 2010, nem no Prêmio PIPA-MAM-RJ. Goebbels, ministro da Comunicação de Hitler, dizia que uma mentira dita várias vezes vira verdade. É o que fazem estes marchands, com um olho no quadro decorativo outro na pista de ski de Aspen. E o colecionador? Leva seu objeto de decoração para casa, como um abatjour ou um ourinol. Sem o sentido Duchampiano.

A arte baiana é controlada por uma máfia de poucas galerias que, como papagaios treinados e bem trajados dizem: "Oh, está lindo! Vai ficar um luxo com seu tapete persa". Desculpem, vou procurar meu ourinol e fundar a arte conceitual na Bahia. Plágio? Pense num absurdo! Já aconteceu na Bahia.

# Ocataviano Moniz é artista visual e jornalista de Salvador (BA)

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