seguidores

23 de setembro de 2010

MACUMBA COM JAZZ

SOFISTICAÇÃO - Bem elaborado, o som baiano agradará geral porque traz elementos sonoros de todo o mundo. | imagem: Sortimentos
VALDÍVIA COSTA

Desde a Idade Média, a base de instrumentos dos grupos populares é formada por tambores ou caixas. A mais antiga referência à participação de negros na criação desses ritmos é genericamente definida por batuques, como bem descreveu José Ramos Tinhorão, pesquisador de música. Que tal fusionar esse ritmo afrobrasileiro com um jazz? Não fica ruim, hem?! Ouçam a atual big band Letieres Leite & Orkestra Rumpilezz

Casamentos assim eram pesquisados por Cecília Meireles. Ela era folclorista, escreveu sobre música. Entre um livrinho e outro, lá estava Cecília, perambulando nas festas negras, absorvendo os batuques. Tinhorão descobriu que foi com esse instrumental que negros africanos começaram a participar das festas públicas no Brasil colônia. Batuques atravessadores do tempo... tum-tum-tum-bá, tum-tum-tum-bá... crescem no som novo baiano, alegres, como bons batucadores, macumbeiros. 

A Orquestra Rumpilezz faz, tanto no estilo big band como nos ritmos do jazz e nos tambores macumbeiros, a cabeça de qualquer um. Tomara que abafe de vez o axé music, que nada tem de original, nem de tradicional, muito menos de Vanguarda. O maestro Letieres Leite foi quem criou a Orkestra, um grupo de sopro e percussão. As composições e os arranjos são concebidos a partir das claves e desenhos rítmicos do universo percussivo baiano. 

Eles curtem tanto percussão que têm cinco músicos tocando atabaques, surdos, timbaus, caixa, agogô, pandeiro e caxixi. Mas a banda é bem maior. Tem 14 músicos de sopro (quatro trompetes, quatro trombones, dois saxes alto, dois saxes tenor, um sax barítono e uma tuba). As composições são inspiradas dos toques dos orixás do Candomblé, de grandes agremiações percussivas como: Ilê Aiyê, Olodum, Sambas do Recôncavo, dentre outras referências rítmicas.


imagem: Rádio UFSCar

Letieres montou o projeto em 2006 e desde então a Orkestra Rumpilezz já passou pelo Festival BNB (Ceará), Teatro Vila Velha, além de realizar temporadas na Casa da Bossa, na Boomeranque e no Pelourinho Cultural da grande Salvador - BA. Nos shows da Orkestra, boas participações como as de Ed Motta, Armandinho, Carlinhos Brown, Toninho Horta, entre outros. Eu estou viciada! Confesso que fazia tempo que não escuta uma sequência de músicas tão diversas, instigantes, cheias de nuances. É caprichado o trabalho, confiram no vídeo abaixo.

Já o livro de Cecília, é a escrita desse som africanizado, abrasileirado e aberto a mais etnias. Era a forma poética musicalizada como ela via esses valores musicais se desenvolvendo, ganhando formas das mais diversas no Brasil de 1920.


imagem: Afrocorporeidade
INTRODUÇÃO - (...) Particularmente na década de 20 começaram a aparecer estudos sobre o folclore brasileiro e a identificação dos ritmos característicos desta cidade. (Rio de Janeiro) Com origem nos batuques e relacionado às pessoas que praticavam cultos afro-religiosos, o samba foi se desdobrando ricamente do ponto de vista musical, coreográfico, poético e social. (...) O samba carioca tem seu lugar merecido nomeado pelo IPHAN como patrimônio cultural do Rio de Janeiro, e aos fenômenos a ele associados podemos creditar a mesma importância, pois, a raiz é a parte fundamental de qualquer criação. (...) (Lélia G. Soares diretora do instituto Nacional do Folclore)

São 70 páginas com 35 desenhos grandes, 35 desenhos pequenos e 35 textos-legendas ilustrando cada desenho. Na primeira página desenhada foram mostrados alguns lápis de giz de cera e em vários desenhos identificamos o seu uso além de carvão, aquarela e nanquim. Não há divisão de capítulos, apenas os assuntos comuns foram agrupados sequencialmente. O livro retrata as décadas de 20 e 30, no centro do Rio de Janeiro (2ª ed., Ed. Martins Fontes, 2003).

Depois de descrever minuciosamente um vestido de uma baiana que vira três personagens no início do livro, a escritora reflete: “Será isto uma fantasia? Parece antes tratar-se de restos de costumes diversos dos vários povos negros transplantados para o Brasil.” No segundo capítulo, ela fala sobre o batuque, o samba, o carnaval, os que fazem o cortejo carnavalesco e sua ambientação musical. 

"O bamba é o parceiro da baiana", diz, descrevendo homens que faziam batuques. O batuque e o samba representam restos de rituais primitivos, segundo Cecília. "O batuque derivou-se da escola de capoeiragem". Os movimentos são expressivos e reveladores nos desenhos da escritora. "Passos cadenciados, pousando os pés com cautela, um adiante do outro". Esse é o Batuque, samba e macumba.
 
imagem: AEL Cecília Meireles
Cecília Meireles é pouco conhecida como folclorista, mas chegou a realizar diversas conferências na década de 30, a partir deste trabalho, que só foi publicado em 1983, patrocinado pela Funarte e Banco Crefisul. O livro teve pouca circulação e tiragem reduzida. Fez diversos estudos, participou do Primeiro Congresso de Folclore junto de Câmara Cascudo, Gilberto Freire, entre outros. Mas pouca referência e algumas nem citam a obra. Há 100 anos Cecília começou a escrever suas primeiras poesias.


-------------------
colaboração: Afrocorporeidade

Um comentário:

Toninho disse...

Esse som é super bacana.
Vale muito ter no acervo.
Valeu nega.