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4 de outubro de 2010

CORRUPTA

PODER - a palavra predileta do ser humano. | imagem: Blog do Leunam
VALDÍVIA COSTA

Sem ter nada para fazer, como de costume, um senador velho estava sozinho em seu gabinete às vésperas das eleições e divagou no que seria o mais "sincero" de todos os seus pensamentos. Com exclusividade, tivemos acesso a essas distorções. Como ele não tinha mais forças de continuar na política e passava a missão ao filho, esticou as pernas na mesa, acendeu um charuto cubano, colocou Miles Davis baixinho no lap top e fluiu...

"Dentro de mim, o vazio. É dele que tiro forças para continuar com meu legado. Com 50 anos de política, só com essas crateras ocas de pudor, sentimentos e valores para continuar sendo o predileto. Quem mais vai ligar para o governo de qualquer instância se o que interessa é o dinheiro? Não fiz nada demais. Só aprendi nessa cartilha surrada e elitizada o que é a vida pra não perder o meu lugar.

Minha filha mais nova, a jornalista, não é como meu filhão primogênito, que está num nível de vida inalcançável por ela, no governo do Estado. Tudo porque ela abomina o que fazemos. Acha que viajar com passagens aéreas de trabalho e dar uns passeios sem resolver nada em algum país é corrupção! Já fizemos de tudo para ela entender, mas ela é idealista, não aceita conceitos práticos.

Se num lugar desse Brasilzão ninguém sabe escrever, sou eu quem tem que fazer projeto pra desenvolver o local? De forma alguma. Eu tenho mais é que guardar esse dinheirão que bate e volta nas prefeituras pra aproveitar nas campanhas, onde vão-se milhões. O partido não brinca: quer tudo nas reeleições. Depois a gente manda alguma coisa às cidades de onde retiramos a verba.

Todos no partido concordam, afinal temos negócios a cumprir. E quando não os convencemos pela força do trabalho conjunto, os vencemos pela fé religiosa e até mesmo pela 'força da palavra'. Não reconheço e desrespeito essas leis e normas sociais, arcaicas. E não estou cometendo crime nenhum! Pior seria se fôssemos assassinos, drogados... ou negros! Apenas estabeleço o jogo político da sociedade. Por isso dei emprego a família, pago bem a todos... que querem mais de um político?!

Meus amigos todos agem da mesma maneira. Afinal quem não quer favores? Por essa conduta certeira, temos acesso privilegiado a bens ou serviços públicos em troca de um pagamentozinho superfaturado de obras e serviços públicos. Como o crime de corrupção pode variar em função das leis existentes e, portanto, depende do país em análise, eu sou um sobrevivente de Vanguarda!"

ALÔ-OW! Enquanto isso, a jornalista filha desse político está preprando uma de suas primeiras reportagens especiais sobre corrupção política para a revista Veja. Ela se deparou nas pesquisas com o que seria a praxe política, o que nunca viu em casa. "As leis e as políticas de governo não devem beneficiar agentes econômicos corruptos, sejam os que dão ou os que recebem propinas."

A filha do senador, que recusou o poder e a cooperação familiar, desconfiava, mas não tinha certeza, do que a corrupção dos políticos da família provocava no povo. Descobriu os deficits na educação, saúde e segurança, sabendo ela que a verba desviou-se para projetos em áreas com propinas e comissões maiores, como a criação de estradas. 

Nem se ela quisesse poderia explicar, justificar ou devolver qualquer situação.

Deu um tom "denúncia" à matéria. Assinou-a com um pseudônimo e foi pra casa, uma mansão no Jardim Europa. Raspou a poupança, pegou objetos valiosos da biblioteca e do quarto dos pais e correu, com um spray nas mãos, pra o aeroporto. Quando o senador chegou em casa leu a pichação em sua porta: "devolva!". Dali a algunss instantes, imprensa, polícia e povão chegavam pra cobrar.

2 comentários:

Toninho disse...

É uma prática recorrente...
É bom que exista a recorrência de textos engajados como o seu. Que nós matenhamos a ingenuidade necessária pra tentar mudar o mundo, pelo menos ao nosso redor.

xistosa, josé torres disse...

Se a sopa política pode ser confeccionada com géneros ou víveres familiares, na panela que está na cozinha, pra quê não aproveitar essa "dádiva"?
O "ouro" (dinheiro) torna o ser humano ladrão!!!
Tinha 10 anos quando ouvi isto e nunca mais esqueci.
A obsessão pode levar à morte (principalmente a quem faz croché. Ainda bem que não sei, rsrsrs)